Quem assistiu ao 25 de Abril e participou no primeiro 1.º de maio, em Lisboa, não mais esquecerá os momentos mais sublimes da sua vida, a alegria contagiante, a euforia que transbordava e a generosidade transmitida mimeticamente pelos militares que fizeram a Revolução.
Nos primeiros anos, o espírito solidário foi uma constante. Ninguém negava dinheiro para uma creche, terreno para uma escola, trabalho em obras sociais. Todos cooperavam nas campanhas de alfabetização, no recenseamento eleitoral, nas mesas de voto ou em qualquer outra tarefa cívica que urgisse.
Depois, lentamente, a cidadania deu lugar ao egoísmo, a disponibilidade ao interesse, a generosidade ao cálculo videirinho.
Ainda hoje sinto o orgulho com que desajeitadamente pegava na picareta para compor um caminho público ou presidia a uma mesa eleitoral que nunca abandonava, com umas sanduiches comidas nos momentos de menor afluxo e interrompidas à chegada de novos eleitores. Se houvesse remuneração, nunca teria integrado uma mesa eleitoral, por julgar esse dinheiro indigno do dever de cidadania que me cabia. E todos éramos assim.
O pagamento dos membros das mesas eleitorais bem como das senhas de presença nos órgãos autárquicos, e outros benefícios, transformaram um dever cívico num comércio onde os autarcas distribuem lugares e ganham eleitores.
Há personalidades que presidem a Assembleias Municipais de remotos concelhos e que vão dos grandes centros às terras de origem com ajudas de custo, quilómetros pagos e senhas de presença. Abdicam os que têm ambições políticas mas recebem-nas os outros, que logo telefonam a saber quando estarão a pagamento.
Que diferença entre os que fizeram a Revolução de Abril e os que se repoltreiam à custa do erário púbico, indiferentes à democracia que receberam generosamente quando numa manhã de abril floriram cravos nos canos das espingardas!
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